domingo, 28 de julho de 2013

Marina Colasanti / Morte sob o sol



Marina Colasanti
Morte sob o sol

Quando se abate uma casa
não se crava o machado de um só golpe
bem junto da raiz.
Nem é de pé que ela cai
com suas ramagens.
Uma casa
se mata devagar.

Extirpa-se primerio o corrimão da escada
abrindo para a queda os inúteis degraus.
Retiram-se as ferragens
as madeiras internas.
Depois se arrancam portas e janelas
vazam-se na fachada os alizares cegos.
E quem passa já sabe.
Aquí nã mais se mora.
Só então é a vez das telhas
esfoladas sem sangue uma por uma.

Ossos à mostra
Jaz
mais que morto
o descarnado esqueleto
no jardim.
Crua laparotomia dos meus fantasmas
a casa em que vivi é posta abaixo.
Vão-se os espectros todos sem abrigo
desfazendo as imágenes superpostas.
Vão nossos son gravados na poeira.
E as palavras
palavras tantas que fiamos juntos
e que as paredes guardam entranhadas
são desfeitas a golpes de marreta.



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